sábado, 7 de março de 2009

Pacientes Especiais


Nesta última terça feira recebi minha quinta dose de quimioterapia.
Pela primeira vez tive a companhia e os cuidados da Thais.
Incrível como os filhos são tão diferentes e tão iguais. Foi atenciosa e prestativa, como a Patricia também o foi, nas quatro anteirores.
Chegamos as duas da tarde e só saímos as sete da noite, sendo que a aplicação mesmo, só começou às quatro.
Nesse tempo todo, estivémos na sala de espera. Um entra e sai sem fim, de médicos, enfermeiras e pacientes muito pacientes.

Estava esperando minha hora quando vejo chegar uma senhora sorridente que me cumprimentou, ainda de longe, com um "oi, tudo bem?".
Dirigiu-se a recepção, falou com as atendentes, e retornou, chegou perto de mim e disse: Oi, querida! Vim marcar a minha quimio, fiz na semana passada. Ainda tenho 16 radio (radioterapia) e depois mais 4 quimios. Nossa,vc acredita que ainda tenho gosto de metal na boca!!!(e riu) E vc, como esta?
Na verdade, confesso que não me lembrava de ter falado com ela antes, mas não tomem isso como displicência de minha parte, é que a quimio "queima" um pouco a minha memória recente, além de "alterar" rapidamente a aparência daqueles que se submetem a esse tratamento.
Mas como ela já havia me cumprimentado na chegada e se dirigido diretamente a mim, supus que já houvéssemos conversado anteriormente.Agora, com ela mais perto observei melhor.
Estava tão bonita e elegante! Usava um vestido de tecido levinho, claro, com uns pequenos detalhes em amarelo, uma bolsa grande, moderna, amarela, um chapéu claro, de abas largas e uma fita com laço, tb amarelo. Mas, mais que tudo, seu rosto estava lindo, com uma leve maquiagem, as sombrancelhas desenhadas a lápis, um batom colorido nos lábios.
Contei que estava aguardando minha vez, para a penultima!!! E que o tratamento estava indo muito bem. E acrescentei, no final do nosso curto diálogo: Vc tá linda! Tá muito bem! Ela respondeu: Vc tb tá ótima. Tudo de bom pra vc! Trocamos beijinhos e ela se foi, sorridente.
Aquela cena ficou gravada em mim.
Ontem a Patty começou a me falar sobre um livro que ela está lendo(Amor, Medicina e Milagres - Bernie S. Siegel)e que classifica a nós, pacientes portadores de câncer, em três categorias:
- Aqueles que querem morrer, consciente ou inconscientemente, portanto ao tomarem conhecimento da doença ignoram, não aceitam, ou fazem pior, aceitam como sentença fatal.
- Aqueles que fazem tudo o que lhes mandam fazer, desde que não exija alteração radical na sua vida, que esperam que os remédios e os médicos sejam os únicos responsáveis pelo tratamento e cura.
- E os que, em menor número, entre 15 e 20%, não querem fazer o papel de vítimas, que aprendem a especialidade de cuidar de si mesmos. Exigem dignidade, personalidade e controle, seja qual for a evolução da doença. Não esmorecem, discutem alternativas, ou seja,lutam pela suas vidas, lutam bravamente contra a doença, e por isso são chamados de PACIENTES ESPECIAIS.

Na hora me veio a mente a figura elegante de minha "amiga" de chapéu com laço amarelo;depois no rapaz de vinte e cinco anos que já se sentou por duas vezes ao meu lado, na sessão de quimio, que não consegue chegar ao final sem que as reações comecem, mas chega sempre sorridente; naquela outra senhora que mesmo sentada ali, brinca com todas as enfermeiras, todos os paciente, ri alto e fala de suas possiveis paixões, e na minha amiga Vera, que tem uma fé inabalável, que sempre me diz: estamos curadas, não tenha dúvidas.

E disse isso a Patricia, que me respondeu: Você também é uma Paciente Especial!

Tenho certeza de que aqueles que tem convivido comigo me considerem muito mais uma IMPACIENTE ESPECIAL, do que qualquer outra coisa.
Sempre digo que tenho agido, diante do câncer, como reajo diante de todas as coisas da minha vida. É o meu jeito, não sei ser diferente disso, e não acho que isso me torne "especial".Não me dispus a lutar "especialmente" contra a doença, sou tão teimosa que estou sempre disposta a lutar contra TUDO com que eu não concorde. E posso garantir, não concordo nenhum um pouco com essa doença, menos ainda com suas reações e consequências.
No entanto, estou certa que ESPECIAL é a oportunidade que esta me sendo dada, de lutar pela minha vida, de rever meus valores, de buscar mais as bençãos que Deus tem preparado para mim, da Sua presença e do Seu cuidado para comigo.
Especial é o privilégio de conhecer pessoas fortes e lutadoras, que não esmorecem, que usam chápeus com laço amarelo e batom nos lábios, e que sorriem ao dizer: tenho 16 radio,e mais 4 quimio, e estou ótima! Estas sim, são PACIENTES ESPECIAIS.

4 comentários:

Joe_Brazuca disse...

Querida Tânia ( sei que num gosta muito que te chame de "querida", mas dá licença, poxa !...vc é querida sim...rs...ah !,,,deculpe...lembrei...vc num gosta é de “lindinha”, né....horrível mesmo...rssrs)

Seu depoimento é extraordinário. Mas não,por falar de "pacientes especiais", não. Mas por falar de "gentes especiais".
O problema das doenças "estigmáticas" que levam no seu bojo SEMPRE a "pecha" de "potencialmente letais" ( taí a questão que vc aborda com sabedoria : a "potencialidade" do fato por muitas vezes é determinado pela "acuidade" que cada indivíduo dá ao termo...) é que é principalmente um paradigma social que ocorre “no outro”, ou melhor “nos outros”, nunca na gente mesmo.
Basta que se toque em câncer, hiv, etc e tal, pras faces se fecharem em expressões de “dó”, ou de repulsa, medo, transtorno, revolta e principalmente auto-comiseração.
É claro que seriamos levianos em não deixar de nos atermos ao fato de que, realmente um câncer não é uma gripe !....Contudo, perece-se de gripe também !...Aliás a humanidade já teve problemas de “extermínios coletivos” com epidemias dessa (hoje) “doencinha”.
Certamente amanha o câncer , o hiv, allzeimer , Parkinson, diabetes, e outros tantos “males” que afligem a existência humana, serão extirpados.Sou um otimista.
Já tive experiências como a sua, só que do “lado de cá” da estória. Como companheiro de pessoas com essas enfermidades. E sei bem o que você está dizendo. Encontramos pessoas extraordinariamente fortes e firmes no propósito (inquestionável) da cura....
Em contrapartida, tb encontramos o seu avesso, infelizmente. São os que maximizam a doença. São os que, triste escolha (contudo é de livre arbítrio, não há o que fazer...) se entregam e por vezes ( já existem provas empíricas quanto a isso...) perecem muito antes do de deveriam, não pela doença em si até, mas pela depressão, angustia e “auto-intolerância” em que entram, muitas vezes sem volta. Mas, não devemos culpar quem “age” dessa forma.Deve-se entender e por conseguinte ajudar.Essa é nossa missão, mesmo porque ninguém sabe o dia de amanha, né mesmo ?...Hoje estamos bem, amanha poderemos não mais estar.Aliás amanha poderemos pertencer exatamente à condição de “Pacientes e/o Gentes especiais”, né mesmo ?
Eu acredito na ciência do homem. Existe “profissionais de boa vontade”, pesquizadores, e toda uma gama de cientistas que estudam incansavelmente, em seus herméticos laboratórios, para a descoberta da cura de todos esses males.
A químio e a radio são ferramentas importantes. Mas logo surgirão outras menos drásticas, tais como os “remédios genéticos”, como as células-tronco.
Basta só que os laboratórios e governos que investem em pesquisas, tirarem um pouco de dinheiro da fabricação de “insufladores da potência masculina” ( que tb é problema, mas, convenhamos, do jeito que está se vendendo...rsrs) e o repassem à fomentar as das pretendidas e necessárias curas dessas outras, bem mais importantes.

um beijo

Joe

Ly disse...

Ta, adorei esse seu depoimento, pq realmente é isso que acredito.
Acho sinceramente que tudo está em nós... e foi isso que Ele nos ensinou.. "E tu, quando orares, entra no secreto e teu Pai, que vê o oculto, te há de recompensar" (Mt, 6,6).

Assim, a energia que emanamos, quando acreditamos na nossa capacidade de conseguir, de lutar, de vencer, move o universo, e nos faz merecedores do sucesso.

Assim, vejo você... merecedora dessa benção, do sucesso da sua empreitada...

Já conversamos sobre isso diversas vezes... da nossa capacidade de lutar e seguir em frente...

E nesse momento, o ser humano quebra todas as estatísticas, todas as probabilidades e surpreende o mundo... e passamos a fazer parte da estatística dos vencedores ou dos que foram agraciados com milagres... qdo simplesmente operamos aquilo que está em nós... e que a maioria não sabe utilizar... o poder da Fé Nele e em nós mesmos...

Amiga, eu, com certeza digo... vc já venceu!!! Pq vc sempre acreditou!!!

Grande beijo

Ly

Carol Garcia disse...

Dra Tania,
Vim comentar com uma certa vergonha, pois seus amigos acima fizeram textos LINDOS e dignos de TANIA! E eu vim fazer "APENAS" um breve comentário, mesmo assim espero que goste!!rs
Eu li com toda atenção o tudo o que escreveu e pelo tempo que nos conhecemos sei que foi tudo totalmente verdadeiro. O cuidado das meninas com você é algo lindo, o interesse pela doença, as leituras, querendo saber os porquês de tudo isso com certeza te ajudam muito! Elas são lindas, suas companheiras de todas as horas. Eu mesmo de longe procuro saber como você está e quando te vi semana passada fiquei aliviada e feliz, você parecia muito bem! Graças a Deus. Sabe, quando a Thaís soube da doença, ela veio aqui em casa desesperada, chorando e me pediu um abraço e disse que: _ "Cá eu não sei viver sem minha mãe, me ajuda! Ora por ela por favor", e chorou e eu chorei com ela por que eu imagino como deve ter sido difícil.
Mas graças a Deus você está bem, reagindo bem e com certeza você é MUITO ESPECIAL, você lutou, NUNCA se deixou abater por nada e é uma guerreira!
Parabéns por ser assim, pela sua determinação em vencer.
Beijos de quem te quer muito bem e sempre lembra de você nas orações diárias.

Carol Garcia.

Encontrando Dr. Hodgkin disse...

Oi, Tânia!

kkkkkkkkk

Adorei o "IMPACIENTES ESPECIAIS"!

Ser paciente é realmente um grande exercício, talvez o maior teste durante os tratamentos...

Beijo!